A brassagem (mosturação)


A brassagem ou mosturação (a palavra mosto vem do latim "mostum", e significa suco, ou suco a ser fermentado), é o processo de cozimento do malte com água quente para a transformação do amido (polissacarídeo) dos grãos em maltotriose (trissacarídeo), maltose (dissacarídeo) e glicose (monossacarídeo), compondo o mosto. Essa é uma atividade muito importante por ser a base de todo o processo, podendo ser executada de forma simples ou extremamente elaborada.

Geralmente utilizamos:
Brassagem com única ou múltiplas rampas/paradas de temperatura
Essa técnica é a mais comum utilizada pelos cervejeiros caseiros no Brasil e consiste basicamente em usar uma fonte de calor, geralmente um fogareiro ou uma resistência elétrica, para esquentar direta ou indiretamente a água de brassagem conforme o programado, seguindo rampas de temperaturas cada qual com uma faixa de atuação enzimática diferente. Assim, podemos produzir um mosto com determinadas enzimas ativas e ajudar na conversão proteica de grãos de trigo e aveia, além de uma parada fenólica para se obter o aroma de cravo tão perseguido nas cervejas de trigo.

As enzimas
Existem várias enzimas que atuam no processo de brassagem, cada qual com uma função específica. Devemos saber explora-las criando condições de pH e temperatura.
As 3 principais enzimas da sacarificação são:
  • Beta Amilase;
  • Alfa Amilase;
  • Limit Dextrinase (60-75°C).
Existe uma faixa de atuação ideal para cada tipo de enzima, não implicando que se trabalharmos fora dessa faixa ideal ocorrerá inativação, apenas teremos uma atuação mais lenta. O gráfico a seguir mostra temperaturas ideais para cada enzima atuar

A alfa amilase trabalha melhor em um pH de 5,1 a 5,3 e a beta amilase em pH de 5,3.

Se considerarmos uma média entre 60ºC e 74ºC, teremos 67ºC, portanto, a brassagem com pH 5,2 e na temperatura de 67-68ºC, poderemos ter a ação das duas enzimas sem problemas, facilitando muito os processos dos cervejeiros caseiros.

Essas enzimas atuam para quebrar moléculas de polissacarídeo (muitos monossacarídeos ligados - amido) em cadeias cada vez menores para obter monossacarídeos ("açúcar" - glicose), liberando no processo álcool e CO2 (fermentação).

Assim, podemos interpretar um polissacarídeo como um caule de cana-de-açúcar e cada gomo de cana como um monossacarídeo. Desta forma, a ação da beta amilase ocorre quebrando as extremidades da cana-de-açúcar em estruturas com 2 gomos cada (2 monossacarídeos = 2 glicoses) e a alfa amilase pode quebrar a cana-de-açúcar em pedaços variados, como as  grandes (dextrinas, que são indispensáveis para fornecer o gosto adocicado, estabilidade da espuma e sensação de corpo na cerveja), como pequenos (como maltoses = dissacarídeo e glicoses = monossacarídeo). As limit dextrinases cortam justamente no ponto central do polissacarídeo, que nem as betas nem as alfas amilases conseguem.

Otimizando uma ou outra enzima poderemos ter cervejas diferentes que pode ser assim resumido:
Beta amilase- (60-65ºC)- Teremos uma cerveja mais seca, mais fermentável e mais alcoólica.
Alfa amilase- (69-74ºC)- Teremos uma cerveja mais encorpada, menos
fermentável e menos alcoólica.

O gráfico abaixo demonstra a ação enzimática durante o processo de brassagem.
Fazendo apenas uma rampa de temperatura, na faixa de 67-68°C teremos uma ação enzimática conjunta permitindo uma boa a conversão do amido. Entretanto, se preferir manter a temperatura mais baixa (66°C) terá um mosto mais fermentável e um a cerveja mais seca enquanto se elevar a temperatura para (69°C) terá uma cerveja mais encorpada e menos fermentável.

Considerando nosso foco principal que é a Kveik, temos que lembrar que essas variedades de levedura, geralmente, fermentam em temperaturas elevadas e, portanto, com alto metabolismo. Isso faz com que elas tenham maior "apetite" e consumam maior quantidade de açúcares fermentáveis, incluindo a maltotriose (ver estudo aqui). Desta forma, podemos ter uma cerveja muito seca se usarmos uma brassagem com temperaturas baixas, otimizando a beta-amilase. Para equilibrar esse fenômeno, podemos realizar o processo em temperaturas mais elevadas (68-70ºC), valorizando a alfa amilase e, consequentemente, produzindo uma cerveja  mais encorpada, menos fermentável e menos alcoólica.

A seguir algumas informações genéricas sob algumas enzimas:
Fitase: Atua entre 30 e 52°C, diminuindo o pH da mostura para que as outras enzimas possam atuar também. pH ideal entre 5,0 e 5,5;
Debranching (várias enzimas): Atuam entre 35 e 45°C, contribuem para a solubilização do amido. pH ideal entre 5,0 e 5,8;
Beta-Glucanase: Atua entre 35 e 45°C, quebrando os beta-glucanos. Geralmente indicada quando há uso de cereais não maltados na receita. pH ideal entre 4,5 e 5,5;
Peptidase e Protease: Atua entre 45 e 55°C, ajudando a diminuir a turbidez final do líquido, quebrando cadeias longas em compostos menores. Produz maior quantidade de proteínas solúveis no mosto. Também ajudam na formação de espuma. O tempo de descanso nesta etapa não deve ultrapassar 20 minutos. pH ideal entre 4,6 e 5,3;
Dextrinase: Atua entre 60 e 62,5°C, é capaz de quebrar o amido em maltose e maltotriose. pH ideal entre 5,4 e 5,8;
Beta-Amilase: Atua entre 55 e 65°C, é a enzima responsável por “transformar” o amido em maltose, que é o açúcar presente em maior quantidade no mosto. pH ideal entre 5,0 e 5,7;
Alfa-Amilase: Atua entre 69 e 74°C, quebrando o amido em cadeias de vários tamanhos, como por exemplo: maltose, maltotriose (por vezes não fermentada por algumas cepas) e dextrinas. É durante esta etapa que se busca dar corpo à cerveja. pH ideal entre 5,2 e 5,8.




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